Sendo ele quem ele era, os sete homens que aqui se apresentam deram uma bela estragada na autoestima – e portanto na vida – de Monique, a protagonista à revelia do brutal novo romance de Breno Kümmel. Do abandono parental ao ressentimento violento, da obsessão com o tamanho do pênis à pura e simples objetificação do corpo feminino, estão cravados nestas páginas os elementos mais perniciosos daquilo que nos acostumamos a chamar de masculinidade tóxica, mas que é, afinal, o que há de mais comum na experiência de quase qualquer mulher. Kümmel não escreve, porém, um tratado moralizante a respeito dos maus comportamentos dos homens e seus efeitos deletérios sobre a psique feminina. Em vez disso, escolhe apresentar a perspectivas desses sujeitos, em capítulos dedicados a cada um deles e a suas falhas ou idiossincrasias e nos quais apela não ao julgamento moral, mas à imaginação dos leitores e leitoras. Seja tecendo o fluxo de consciência febril do cara que descobre vídeos pornográficos antigos da atual namorada, seja nos colocando na pele de Monique ao ouvir o ponto de vista do pai omisso, Sendo ele quem ele era não descamba jamais pelo caminho fácil do maniqueísmo acusatório. Pelo contrário, ao acessarmos pelos recursos sofisticados da ficção o interior desses homens, nos vemos em um universo muito mais ambíguo e enrascado do que aquele que preferimos encarar quando se trata de machismo e misoginia. Kümmel corre toda espécie de perigo nestas breves páginas, tanto formal quanto afetivamente, investindo em diferentes dicções e registros, mas também arriscando-se a criar espaços de empatia com homens hediondos ou, na melhor das hipóteses, medíocres. A dupla aposta compensa. Lançadas à intimidade desses homens – em suas consciências, suas conversas privadas, seus embates tolos ou profundos –, apreendemos por dentro, sem condescendência alguma, o quanto eles também são vítimas tão cruéis quanto doloridas de suas próprias e terríveis bobagens. (texto de orelha por Ligia Gonçalves Diniz)