Em 1972, em plena ditadura militar, uma família inteira foi levada para o DOI-Codi de São Paulo: duas crianças de 4 e 5 anos (Edson e Janaína de Almeida Teles), os pais (Maria Amélia de Almeida Teles e César Augusto Teles) e a tia (Criméia Alice Schmidt de Almeida), que estava grávida de sete meses. Os adultos integravam o PCdoB, partido que estava proibido. As crianças foram levadas para vê-los na prisão. A mãe disse que nunca esqueceu a pergunta da filha: “por que você está azul e o pai, verde?”. Criméia foi torturada grávida, mas conseguiu ter seu filho, João Carlos, presa. Em 2005, a família propôs um processo contra o antigo chefe do DOI-Codi, o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, para que fosse declarada a relação jurídica entre eles e o réu por prática de tortura. Em 2008, os pais e a tia ganharam em primeira instância: o juiz considerou que o DOI-Codi era uma “casa de horrores” onde se praticavam “ilícitos absolutos”. O réu acumulou derrotas judiciais: no Tribunal de Justiça de São Paulo, no Superior Tribunal de Justiça e, pouco depois de falecer, no Supremo Tribunal Federal. Enquanto a ação se desenrolava, a Lei de Anistia foi contestada judicialmente pela OAB, o Brasil foi condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso da Guerrilha do Araguaia, criaram-se diversas comissões da verdade no país e o réu, postumamente, foi homenageado na votação do impeachment da presidenta Dilma Rousseff por um deputado que chegaria à Presidência da República poucos anos mais tarde. Como este processo pioneiro pôde obter êxito em um país ainda marcado pela impunidade dos crimes de lesa-humanidade e pela ingerência política dos militares? Ilícito absoluto conta essa história, que serviu de precedente para outras ações que tentam responsabilizar agentes da ditadura.