Mar- palavra e resistência fundam o projeto literário de uma artista sensível e consciente de sua tarefa- Escritora nascida na cidade do mar- Andréia Pires encontrou no manejo das águas e das metáforas a unidade poética de seu trabalho- Nasce daí a imensa força dramática e simbólica da obra O céu riscado na pele (2021)- A trajetória de Lúcia- protagonista do romance- evidencia que uma história de mulheres contada por mulheres instaura a ruptura e a contestação como horizontes éticos e estéticos- Lúcia questiona construções seculares do sistema patriarcal- contrariando o medo e a naturalização dos ciclos de violência vividos por todas nós- Neste sentido- o alcance social da maternidade aparece como ponto de investigação sobre a trajetória das mulheres no mundo- Ser ou não ser mãe é motivo de cobrança social permanente em nossas vidas- exigência reveladora das relações sociais de dominação exercidas pelo patriarcado- No percurso de Lúcia- o direito ao corpo é um direito à vivência da própria subjetividade- Jornalista e moradora da Praia do Cassino- Lúcia é uma mulher da palavra e do mar- Na imensidão das águas- ela encontra uma densidade intimamente sua e profundamente nossa: o que o mar tem de profundo- temos todas nós de coragem para lutar por nossa liberdade no âmbito de um sistema opressor e violento- Em O céu riscado na pele- o destino das mulheres do mar é o voo- A metáfora que dá título ao texto é tão oportuna quanto reveladora: desenhamos a liberdade em nossos corpos- escrevemos a força em cada parte que nos compõe- No romance- a mãe e a avó de Lúcia fornecem espelhos para que possamos ver onde estamos- para onde estamos caminhando e em que medida precisamos avançar- Nenhum voo de mulher é solitário- Voamos juntas- Todo voo de mulher é coletivo- organizado a partir da força integradora de muitas asas- É preciso reconhecer o trabalho daquelas que vieram antes e daquelas que estão ao nosso lado- Uma história de mulheres contada por mulheres estabelece nossas memórias- nossas lutas e nossos sonhos como centros da narrativa e como início do nosso Levante-