Não reconheço o sagrado, nem tampouco presto a ele alguma deferência. Trata-se de uma bobagem oriunda da fé, palavra esta que alço ao lugar mais alto do pódio das misérias da Humanidade. A fé é tão tosca e sem sentido que o criador, se é que realmente ele ou ela existe, sequer um dia precisou tê-la. Por que alguém que tudo criou necessitaria ter fé na própria criação? A fé é o recurso das criaturas incompetentes. O Universo existe para ser constatado e não para ser alvo da crença infantil dos fracos e dos incapazes de compreendê-lo de fato. Para estes, o que resta para que o cérebro crie algum sentido sobre a própria vida é essa imaginação mitológica medíocre e que serve de alicerce para as religiões inebriantes e inúteis.
O que sinto por aquela desgraçada desencarnada não tem relação alguma com fé, muito menos com o sagrado. É apenas paixão, completamente incontrolável, doentia, e que começou para meu azar e ironia em meio ao ruído primitivo daqueles malditos atabaques. Nunca havia me apaixonado, sempre achei esse tipo de sentimento um descontrole dos mais fracos e dos emocionalmente dependentes. Nascemos e morremos sozinhos, e por que diante de tão inexorável caminho precisamos gastar energia vital para criarmos um laço de dependência tão forte em relação a outro ser qualquer que um dia desses nos deixará? Só agora, no entanto, percebi que a paixão não é uma escolha, é um distúrbio.