Etelvina é um romance em primeira pessoa- estruturado como o diário de partida de uma mulher idosa- diante do diagnóstico de uma doença terminal- A protagonista mal completou o curso primário- daí o primeiro desafio narrativo autoimposto pelo autor- no plano da linguagem: criar uma voz plausível a um narradora que se aventura pela primeira vez na escrita- Ela conta da sua passagem por quatro locais muito distintos: o vilarejo em que viveu seus primeiros vinte anos- a fazenda em que passou as duas décadas seguintes- levada pelo marido- a cidade pequena em que residiu por mais dez anos e a cidade grande em que se fixou até o tempo presente- em que escreve- aos noventa anos- No decorrer de curtos capítulos- alternando tempos sem cronologia definida- percebemos- a despeito do vocabulário restrito e das limitações de recursos gramaticais- o surgimento de uma musicalidade muito lírica- indissociável de sua escrita- repleta de oralidade- À medida que se aproxima o prazo do pano de fundo proposto- ou seja- o da morte iminente- vamos percebendo o surgimento do verdadeiro drama em questão- o do silenciamento dessa mulher em uma sociedade dominada por homens- em que a ela foi destinado apenas um papel na vida: servir- A narrativa aponta para o que foi- mas sobretudo para o que poderia ter sido essa personagem no tempo- caso vivesse em um mundo não patriarcal- Na construção do romance- Marcílio Godoi não apenas se inspirou nas histórias contadas por sua mãe e nos acontecimentos descritos por ela ao longo de sua vida- o autor procurou sobretudo explorar a simplicidade naturalmente literária da prosódia interiorana de Etelvina e a alta dose de sabedoria popular ali presente-